hobbit cartazLembro-me de sentir algo muito parecido com saudade logo depois que saí da estreia de O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei. Era um sentimento estranho. Estava mais do que satisfeito com encerramento da trilogia mesmo tendo entrado no cinema com a expectativa muito alta. O que me incomodava era saber que no ano seguinte não haveria aquela espera por mais uma viagem à Terra Média brilhantemente construído por Peter Jackson e uma extraordinária equipe. Lembro ainda que pela primeira e única vez na vida torci por um filme nas premiações, como se fosse um torcedor fanático de qualquer esporte. Fã de Tolkien e leitor de sua obra, voltei a ser criança com a notícia oficial de que O Hobbit seria adaptado e que, portanto, já tinha outra viagem marcada. Bastava esperar.

Torci o nariz quando soube da megalomania de dividir o livro em três filmes e nunca mais senti a mesma empolgação com nenhum dos três filmes de Bilbo Bolseiro e sua jornada com os anões liderados por Thorin Escudo-de-Carvalho. Não foi diferente nesse terceiro filme e em vez de sentir um vazio, confesso que fico aliviado que os excessos de Peter Jackson acabam por aqui. Pelo menos por enquanto.

Começando imediatamente onde termina A Desolação de Smaug, esse terceiro episódio se arrasta em uma construção de uma batalha supostamente épica às portas de Erebor entre homens, elfos, anões, orcs… e morcegos e ursos e minhocas gigantes e águias e carneiros e corvos… uma grande bobagem que teria funcionado se não estivesse entre O Hobbit e O Senhor dos Anéis. Mas está e merecia mais respeito.hobbit batalha cinco exercitos

Jackson, Fran WalshPhilippa Boyens e Guillermo del Toro assinam um roteiro fraco e nada criativo buscando dar a mesma grandiosidade da primeira trilogia a uma história que não oferece a mesma riqueza que a obra máxima de Tolkien. Apesar de uma certa fidelidade ao livro que deu origem aos filmes, os roteiristas fazem uma colcha de retalho com o material trabalhado há uma década em O Senhor dos Anéis. Vejamos. Sem muito esforço, o espectador encontrará em A Batalha dos Cinco Exércitos cenas que remetem diretamente ao Abismo de Helm, a chegada de um exército ao por do sol, o resgate das águias gigantes, personagens cumprindo as funções narrativas de Denethor, Faramir, Gríma e mesmo Aragorn de uma forma tão grosseira que poderíamos ver plágio se os primeiros filmes não tivessem sido produzidos pelas mesmas pessoas. Nem a trilha de Howard Shore escapa dessa armadilha.

batalha cinco exercitos

O roteiro é uma ofensa. Os primeiros minutos servem para terminar o segundo longa. Levianamente subtraído do segundo filme, o destino de Smaug é resolvido antes que o título do filme surja na tela e então viajamos na megalomania do Michael Bay da Terra Média. Uma grande bobagem atrás da outra. Por que somente a família de Bard é imune aos perigos, mesmo com tantas mortes durante todos os ataques? De onde surgem aquelas convenientes minhocas gigantes? Por que elas não acabaram com a guerra logo de cara abrindo um buraco sob os exércitos dos elfos e anões? Elas não poderiam cavar Erebor de uma vez? Além disso, toda batalha segue a mesma fórmula de chefes e subchefes que se enfrentam em ordem clichê. Pior: aqui os personagens parecem estar em um jogo de vídeo game, com execuções finais que parecem fatalities. As características de Legolas que funcionavam em prol da narrativa na primeira trilogia e ainda davam um charme ao personagem (quem se lembra de quando ele anda sobre a neve e desliza a tromba de um Olifante?). Aqui, suas ações impossíveis soam o ridículo, até porque, como sabemos que ele não morre, expô-lo a perigos extremos para colocar acrobacias estúpidas transforma todas as suas cenas em um enfadonho anti-clímax. E, claro, o mesmo vale pra Gandalf, Saruman, Elrond e Galadriel. Ao menos vemos os três em ação, o que vale para agradar aos fãs.

No aspecto visual e sonoro, como é de se esperar, o filme cumpre o que promete. Smaug é excepcional, a sequência inicial chega a prometer um grande filme. O bom design de produção chega a ser um desperdício para esse roteiro rasteiro. Até mesmo a Cidade do Lago oferece lindas imagens, ainda que pareça mais artificial do que qualquer outro cenário do filme. Nada disso é suficiente para livrar O Hobbit de ser uma bomba. Jackson parece querer criar um vínculo entre as duas trilogias, mas ele gastou um tempo enorme pra isso. Poderia ter feito bem. Não sou purista com nenhuma adaptação. O grande problema é que ele poderia sim ter feito tudo isso, mas poderia ter feito direito. Afinal, ele já mostrou que sabe fazer.

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Escritor e Crítico Cinematográfico, membro da Associação Paulista de Críticos de Arte e da Sociedade Brasileira de Blogueiros Cinéfilos.

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