Como aperitivo de um filme tão especial e cheio de ótimas surpresas, que tal uma comédia romântica no Dia dos Namorados em um aconchegante bistrô com várias pequenas histórias de amor sem nenhuma pieguice?

Assim é Bistrô Romantique, primeiro longa metragem do realizador belga Joël Vanhoebrouck que reúne em um jantar as mais diversas situações amorosas. E é impossível não encontrar uma (ou todas, vai saber…) para se identificar.

Como primeira entrada, o diretor consegue extrair atuações impecáveis dos atores. A atriz Sara de Roo vive a protagonista Pascaline, dona de um renomado estabelecimento com o irmão Angelo (Axel Daeselerie), chef de cozinha, que precisa coordenar o restaurante cheio de reservas enquanto enfrenta conflitos ao reviver um amor do passado. Acompanhamos o arco central da protagonista e somos apresentados a todos os demais personagens secundários, clientes do restaurante, e assim passamos a conhecer os respectivos dramas e desilusões amorosas.

Todos esses pequenos arcos são tão interessantes quanto o principal naquele momento crucial na Brasserie Romantiek.  Com diálogos inteligentes, todo o histórico dessas tramas nos prende até o desfecho de cada um: há a garota separada há anos que reserva um lugar só pra ela, um casal bem sucedido financeiramente com a relação já fria, um casal que se conheceu pela internet e marca ali o primeiro encontro e outras pequenas situações pouco exploradas, mas que garantem um bom equilíbrio cômico, como um jovem casal trocando presentes e outro com uma enorme diferença de idade.

Para contar cada uma dessas histórias, o diretor opta por enquadramentos sempre muito fechados e com foco no rosto dos atores na maior parte do filme. Além de sugerir que devemos prender nossa atenção nos personagens e nos seus dramas (que nos tornam vulneráveis na vida real), este estilo do diretor também nos aproxima dos planos detalhes, que são a chave para a compreensão do filme – e não é por acaso que vemos planos mais abertos quando Pascaline conversa com sua sobrinha Emma (Zoë Thielemans) dentro do apartamento.

E esses são oferecidos como a segunda entrada: o grande mérito de Vanhoebrouck está nos excelentes planos detalhe que sugerem o tempo inteiro o que está por trás das atuações e das situações acima. A meticulosidade ao arrumar os talheres antes do primeiro cliente chegar logo no início da projeção se repete ao longo do jantar, quando há um pequeno ajuste de objetos sobre a mesa ou, com o mesmo movimento, a troca de posição de dois chocolates em uma embalagem. Além disso, os planos que revelam a preparação dos alimentos, aliados a uma excepcional montagem, sempre complementam de forma visual as sequências anteriores, como metáforas bem orgânicas como “fritar” ou “temperar”. Isso é tão revelador que não há como não aplaudir esse cuidado do diretor.

O mesmo vale para as cenas dentro do banheiro, algumas com a maravilhosa atuação de Mathijs Scheepers como o introspectivo Walter e outra com a desiludida (e linda!) Mia, vivida por Ruth Becquart. Consciente de todo o material que tem à disposição para contar essa história, o diretor se entrega a uma sequência inteira envolvendo a personagem Roos em que explora os nossos cinco sentidos, digna de nota por ser imprescindível para a compreensão do filme.

Já o prato principal é o roteiro de Jean-Claude Van Rijckeghem e Pat van Beirs. Recheado de pequenas reviravoltas em cada uma das tramas apresentadas logo no inicio, a narrativa se divide nas etapas do jantar e é com muita segurança que os dois roteiristas amarram todas as pontas com um desfecho surpreendente. E sobre esse único prato servido na noite dos Dias dos Namorados, limito-me a dizer que é delicioso. Vá provar sem maiores revelações!

A sobremesa desse belíssimo longa metragem é mostrar como todas essas histórias que acontecem durante a noite se relacionam intimamente com a protagonista. Sugiro ao leitor que reflita um pouco sobre o plano de um casal gay se beijando somado ao momento que a assistente de cozinha se despede no filme logo após o jantar (isso não é spoiler). Com um olhar mais aguçado, o espectador perceberá que Bistrô Romantique não é um filme que se passa em uma noite, mas sim conta uma longa história de muitos amores e muitas decepções.

No fundo, o filme investe em um pedaço da riqueza da nossa natureza humana, sempre disposta a depositar a esperança da felicidade no amor, mesmo sabendo o final de qualquer relação afetiva é invariavelmente trágico, seja pela perda ou pela separação – mas ainda sim irresistível.

Bistrô Romantique (Brasserie Romantiek)

Direção: Joël Vanhoebrouck
Elenco: Koen de Bouw, Sara de Roo, Axel Daeseleire
País: Bélgica 
Gênero: Comédia Romantica
Ano: 2013
Duração: 102 min
Distribuição: Esfera Filmes / Vitrine Filmes

 

Author

Escritor e Crítico Cinematográfico, membro da Associação Paulista de Críticos de Arte e da Sociedade Brasileira de Blogueiros Cinéfilos.

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