Com a frase do título temos um desabafo de uma mulher diante de sua psiquiatra. Assim temos a história de Melinda em ACRIMÔNIA, o novo filme do diretor Tyler Perry.

Assisti o filme principalmente pelo título nada chamativo, Acrimônia mas que aguçou a curiosidade e por retratar de um assunto discutido atualmente sobre relações abusivas e situações de abuso em que não percebemos que somos colocadas (os).

ACRIMÔNIA significa aspereza e severidade e com certeza a personagem do filme que é mais severa é Melinda (Taraji P. Henson). Ela é severa consigo mesma e com relação as outras personagens do filme. Sabe quando ser severo faz mal para si mesmo?

O roteiro é aquela história sem final feliz e que todos sentimentos são levados ao extremo. Melinda conhece Robert (Lyrif Bent) quando muito jovem e no momento que perde sua mãe.  Robert vira seu ponto de apoio no qual Melinda aposta todas suas fichas e o ama intensamente.  O casamento de ambos parece um jogo e nele Melissa entrou para não perder. Diante das telas vemos o começo maravilhoso e o desmoronamento/desencantamento que acontece diante da rotina e do tempo. O espectador parece envelhecer e se cansar junto com a protagonista.  Há uma sensação de esgotamento que nos chega e nos faz querer desistir do filme.

A relação desmorona com Melinda jovem sendo traída e ao invés de seguir só, ela perdoa o marido.  Há uma sensação de que ela e porque não dizer que algumas mulheres se acostumam a somente sofrer em suas relações e aceitam o sofrimento como forma de amor.  O casamento segue cheio de promessas de uma vida que Robert nunca vai poder oferecer de verdade para a mulher.

Importante destacar o abuso também nas relações familiares neste filme, onde todos mandam na vida de todos e parece nunca haver um respiro.

Toda história é narrada por Taraji através de flashbacks, recontando como conheceu o marido, da sua separação e de todas suas mágoas.  É um vômito de palavras e um crescente na interpretação de Taraji.  Veremos diante da tela uma esposa que no seu limite e cansada de ser a base emocional e principalmente financeira do marido decidi se separar.

Durante o casamento Melinda já nos apresenta uma personalidade impulsiva e possessiva e com passar dos anos e principalmente após a separação tudo chega a ser extremado. Melinda tem uma relação insustentável com o marido e o mais interessante ou ridículo da parte do roteiro é que parece que só depois de Melinda pedir a separação do marido a vida desta melhora muito.

Ouvimos a versão de Melinda que parece dúbia por vários momentos (o que não é surpresa numa sessão de psiquiatra ou psicologa) e que ficamos em dúvida se o que ouvimos e vemos aconteceu de verdade ou seria apenas o que Melinda acredita que aconteceu? Fato é: eles deveriam ter se separado lá no início, mas assim o roteiro não andaria e uma mulher sedenta por vingança é um prato cheio de o quanto o ser humano pode se humilhar ou chegar num nível de loucura.

Confesso que fica difícil como espectadora acompanhar o filme tamanho absurdo que roteiro vai sendo levado no terceiro ato. Além de que sinceramente há momentos de interpretações sofríveis. O primeiro solilóquio de Melinda corporificado em Taraji já é forçado e cheio de marcas que acredito terem sido dirigidas meticulosamente.  Estranhei a interpretação de Taraji que já tem inúmeros prêmios e indicações em sua carreira, mas que neste exagera de uma forma que força para chegar numa verdade.  Seus melhores momentos (raros) são quando o “menos é mais”.

O roteiro é sofrível da metade para o fim e o final é um erro. É tão novelesco e cafona, que espero que você tenha paciência para atravessar toda loucura com Melinda e chegar a cena final. Não ouso dar sapoilem, mas tudo acaba num lugar tão absurdo, com figurinos absurdos, locação e atuações que não tem coesão com restante do roteiro. É histérico.

Qual seria a discussão que o diretor (que tão pouco conhecido no Brasil, mas com um trabalho mais consistente lá fora) quis levantar? Seria sobre relacionamentos abusivos e suas consequências? A felicidade que alguns projetam nos outros? A sede de vingança que alguns carregam após um término? A necessidade obsessiva de alguém sobre uma pessoa? Poderia ser genial as discussões e claro que é muito triste ver uma pessoa de afundando numa relação, mas Tyler não agradou.  É um verdadeiro abacaxi e daqueles fora de época.

Tyler perdeu as rédeas, Taraji exagera, mas uma coisa me pegou: o filme é feito apenas por atores negros e os poucos personagens que fazem figuração e interpretam empregados são atores brancos.  Infelizmente sabemos que o mercado cinematográfico e das artes dá pouquíssimas oportunidades para atores negros e aqui vemos um diretor negro dirigindo atores negros. Me agrada, pois é raríssimo se ver nas telas, teatro e artes em geral o negro sendo protagonista de algo e porque não dizer: atendidos por brancos.

Pesquisei que Tyler aborda temas raciais, mas aqui parece errar feio na sua discussão. Saio com aquela sensação de que valeu por ter visto um filme com atores negros e até comentei com pessoas que não perceberam isso.  Como pode?

Esteja preparado para ouvir um lado apenas da história, talvez se incomode com aquele clichê de mulher traída é tudo louca e que todo homem mente e trai. Mas são estes clichês ou estereótipos que conduzem a trama e levam a grande vingança.

É 2018 nos trouxe um filme cafona.  Se nos EUA a bilheteria foi ruim, eu espero que os brasileiros esperem e exijam um pouco mais da sétima arte.

Author

Atriz há 16 anos, apaixonada por cinema. Filha do gerente do ex-cinema Marrocos.

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