AGrandeVitoria-FINAL-ARTA Grande Vitória é uma ótima surpresa. É um filme com tantos detalhes de linguagem interessantes que, mesmo com alguns problemas, a experiência de assisti-lo é no mínimo agradável e merece ser visto sem ressalvas, ainda que tenha a inexplicável escalação de Ratinho e Sabrina Sato que não contribuem em nada, mas também não comprometem a narrativa quando surgem em cena.

Baseado em fatos reais e adaptado do livro Aprendiz de Samurai escrito pelo próprio protagonista Max Trombini, o filme dirigido pelo estreante Stefano Capuzzi Lapietra conta a história de  um garoto pobre (Felipe Falanga/Caio Castro) abandonado pelo pai e criado pela mãe Teresa (Suzana Pires) e pelos avós. Rebelde na infância e com o avô (Moacyr Franco) sempre protetor, o menino Max se envolve em brigas na escola até que um dos professores indica o judô à mãe como forma de canalizar a agressividade do menino, além de direcioná-lo a uma conduta firme ensinada pelo instrutor (Tato Gabus Mendes) de uma academia em Ubatuba.

Após a melancolia musical do maestro João Carlos Martins e uma sequência que mais parece um flashforward no início com Castro e Sato e que pouco contribui para o arco dramático do protagonista, logo passamos a acompanhar no primeiro ato a infância de Max. E já passamos a perceber os pontos fortes do filme que é a direção de arte e a montagem cuidadosa com raccords visuais, sonoros e de movimento. Um detalhe interessante na fotografia que contribui demais para construir o personagem é a preocupação em mergulhar Max em cenários frios e com tons de azul-claro como nas paredes da sua casa humilde e de deixar em todos os planos objetos em tons semelhantes, como sua bicicleta, seu uniforme escolar, sua mochila e mesmo o túmulo de uma pessoa querida.

Essa relação entre o protagonista e as cores terá influência no segundo ato quando, já adulto, passa a derrotar seus adversários todos em quimonos azuis fortes e vivos, o que remete à luta contra todas as dificuldades que enfrentou devido a sua origem pobre. Não é por acaso que surja vestindo o quimono azul simbolizando a sua verdadeira vitória no terceiro ato, sua superação plena, já como um atleta maduro e pronto para buscar o sonho de disputar as olimpíadas.

E é graças a seu primeiro mestre de judô que consegue buscar esse crescimento pessoal. Gabus Mendes entrega uma bela e tocante atuação, vez ou outra prejudicada por frases prontas e de efeito (“Quanto mais cai, mais aprende”). Mas por se tratar de filme baseado em fatos reais, não duvido que esses ensinamentos tenham sido ditos de verdade pelo professor. E o mais legal é que, consciente disso, o roteiro trata de brincar com uma das frases em um ótimo momento de Castro e Gabus Mendes.

Longe de se entregar a uma pieguice do atleta que supera todos os obstáculos, o roteiro apresenta conflitos paralelos na vida de Max e nenhuma decisão do protagonista soa vazia ou imediatista, ainda que o personagem mostre impulsos que o levaria a tomar decisões equivocadas. E mesmo se uma inexplicável tempestade repentina incomodar ao final do segundo ato, mais uma vez o diretor e roteirista, consciente, usa um plano contra-plongée em um chuveiro para formar uma rima visual e sonora que imediatamente nos faz entender como Max se sente, já que são os dois pontos mais altos em sua vida e onde o filme deveria ter acabado, sem nos levar a um desfecho desnecessário, quando então entendemos a razão do “flashforward” que abre o filme.

Sem entrar em spoilers, é só aí que entendemos como Max conheceu Alice (Sato), uma jornalista que frequenta a mesma academia e com quem passa a viver um romance relâmpago, que já ficara claro nos primeiros cinco minutos de projeção. O grande problema desse desfecho é que não sabemos nada de Alice, nada é construído em nenhum momento da narrativa e arrisco dizer que nem se qualquer outra atriz com muito mais talento e experiência que Sabrina Sato fosse escalada em seu lugar, não sentiríamos qualquer preocupação com a personagem, afinal não está presente em nenhum dos três atos e parece somente uma justificativa para colocar uma celebridade no elenco.

O importante mesmo é que nada disso afeta negativamente o filme. Vale o ingresso e a experiência, pois podemos perceber a cada plano que profissionais dedicados empregaram com cuidado elementos de linguagem cinematográfica e entregaram uma boa produção para o cinema nacional.

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A Grande Vitória

Com Caio Castro, Sabrina Sato, Tato Gabus Mendes, Suzana Pires, Moacyr Franco, Felipe Folgosi
Direção de Stefano Capuzzi Lapietra

FICHA TÉCNICA

Produzido e Dirigido por: Stefano Capuzzi Lapietra Música: João Carlos Martins Roteiro: Paulo Marcelo, Stefano Capuzzi Lapietra, Wagner Hilário Inspirado no livro Aprendiz de Samurai de Max Trombini Direção de Fotografia: Toni Gorbi, ABC Montagem: Deo Teixeira, Pedro Andreta Direção de Arte: Tulé Peake, Lina Fridman, Maira Fridman Produção de Elenco: Cecília Homem de Mello, Gerson de Andrade, Maurício Cenci, Paula Pretta Figurino: Carlos Gardin Maquiagem: Mário Lúcio Som Direto: Romeu Quinto, ABC Desenho de Som e Mixagem: Alessandro Laroca, Eduardo Virmond Lima, Armando Torres Jr. Supervisor de Pós Produção: Tomás Pastén Produção Executiva: Célia Regina Ferreira Santos, Rodinei Lapietra Jr. Diretor 2º Unidade: Filippo Capuzzi Lapietra Distribuição: Paris Filmes / Downtown Filmes

Author

Escritor e Crítico Cinematográfico, membro da Associação Paulista de Críticos de Arte e da Sociedade Brasileira de Blogueiros Cinéfilos.

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