“Quando você olha para mim, o que você vê?”

Essa frase aparentemente inoportuna e que marcou o bom O Protetor (2015), na verdade, é carregada de significados. Se no primeiro filme serviu para pontuar um ótimo (e tenso) diálogo entre o Robert McCall de Denzel Washington Protetore o vilão Teddy de Marton Csokas, aqui ela surge apenas como uma deslocada referência, cumprindo uma função bem menos nobre, a de incentivar o espectador a enxergar O Protetor 2 como este realmente é: uma continuação com pouco a dizer e que mal consegue disfarçar sua natureza caça-níquel.

Claro que nesse cenário há Denzel Washington, um dos melhores atores em atividade e que é capaz de elevar o nível de qualquer produção. Portanto, por mais que o novo filme do diretor Antoine Fuqua flerte com a monotonia, Denzel Washington sempre aparece para engrandecer a história. 

Dono de um currículo que inclui 16 Quadras, Os Mercenários 2 e o próprio O Protetor, Richard Wenk já mais do que comprovou sua experiência em filmes de ação e coloca todo o seu arcabouço em prática ao estruturar a continuação como um típico longa de vingança. Não à toa, todo o primeiro ato é dedicado a estabelecer a rotina de McCall e sua amizade com Susan (Melissa Leo). Por isso, dizer que ele inicia uma caçada aos culpados pela morte da amiga é chover no molhado, embora seja exatamente a trama principal.

Gastando um tempo precioso para incrementar a personalidade de bom moço do protagonista, O Protetor 2 demora a engrenar. E mesmo quando o faz, investe em sequências de ação pouco imaginativas, limitando-se a repetir (em menor escala) as divertidas invencionices de seu antecessor, quando víamos McCall aplicar a tática de guerrilha para eliminar inimigos sem utilizar armas de fogo, aproveitando-se apenas do ‘arsenal’ de uma loja de departamentos. 

Esse ritmo lento é corroborado pela montagem burocrática do veterano Conrad Buff (outro veterano dos filmes de ação) que, embora corte com parcimônia, acaba deixando de imprimir a energia que a trama demanda, como o que acontece no clímax, onde a ambientação (uma cidade atingida por um furacão) acaba suprindo parte dessa necessidade por injetar adrenalina. Ironicamente, é justamente na primeira metade que Buff se sai melhor, ao impedir que dia-a-dia de McCall não descambe para o tédio.

Por falar na primeira metade, é nela que O Protetor 2 concentra seus esforços em ressaltar o caráter heróico de Robert McCall, mostrando um desenvolvimento interessante em relação ao filme anterior. Se em O Protetor, McCall utilizava o sorriso largo e as boas atitudes como uma espécie de compensação por décadas dedicadas ao trabalho sujo prestado à CIA (aliada ao ócio da aposentadoria), agora McCall parece dedicar-se única e exclusivamente a ajudar pessoas, empregando o seu trabalho de motorista como o meio de ligação com os problemas de seus clientes. 

Nesse sentido, Denzel Washington, como sempre, faz um excelente trabalho, transformando McCall numa figura atormentada pelo passado, mas que encontra forças para seguir em frente através da possibilidade de ajudar o próximo, seja uma jovem agredida pelo namorado, um pai negligente ou um simples idoso à procura de seu antigo amor. Essa figura messiânica, vale ressaltar, é equilibrada, com perfeição, com o lado obscuro de McCall, exacerbado pelo talento do ator: ágil e letal com poucos movimentos, o ator é enérgico ao executar a boa coreografia de luta e não tem dificuldade em estabelecer McCall como um sujeito gentil e bondoso, mas também implacável.

As lutas corporais, mais uma vez, são carregadas de violência, o que certamente arrancará sons curiosos dos espectadores mais sensíveis. Mas entre as sequências de ação, o melhor momento é aquele que envolve uma luta dentro de um carro em movimento, entre o motorista e um passageiro (no banco de trás). A movimentação da câmera, junto da coreografia precisa e a direção em sintonia com a montagem, colocam essa sequência como o ponto alto da produção.

Já a direção de Antoine Fuqua, que no antecessor explorou em demasia a figura de Denzel Washington e sua persona assassina, volta a referenciar o Blaxploitation ao fazer de O Protetor 2 um autêntico ‘filme de vigilante’. Entretanto, sua predileção quase obsessiva pelo ângulo holandês (aquele que inclina o plano) demonstra um excesso estilístico até, de certa forma, interessante. Seu maior desafio, no entanto, é distanciar o filme de sua fonte (trata-se da adaptação de uma série de TV, afinal), daquelas obras genéricas que costumam se acumular na TV por assinatura, mas com flashbacks pavorosos e a linguagem pouco inspirada, o diferencial da produção acaba sendo mesmo Denzel Washington.

Reforçando a aproximação com a linguagem televisiva através da utilização da boa trilha de Harry Gregson-Williams (Megatubarão), que surge para acompanhar o título da produção e marcar o fim do “episódio”,  O Protetor 2 não só é inferior ao primeiro filme, apequenando-se em ritmo e intensidade, como recicla grande parte das sequências de ação de seu predecessor. Para os fãs da recém iniciada franquia (é a primeira continuação de Denzel Washington, diga-se de passagem), pode soar um esforço satisfatório, mas se eventualmente acabar divertindo os não-iniciados, os méritos provavelmente recairão sobre os ombros de seu astro.

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Crítico de Cinema e Carioca. Apaixonado pela Sétima Arte, mas também aprecia uma boa música, faz maratona de séries, devora livros, e acompanha futebol. Meryl Streep e Arroz são paixões à parte...

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