Quando chegou ao 15º andar, Marcelo mal conseguiu empurrar a porta de madeira do elevador antigo do seu prédio. A alta taxa de álcool no corpo do rapaz de 35 anos, o deixara sem reflexo e o cansaço, sem força. Usando o peso do corpo, abriu a porta do elevador com os ombros. No trajeto até a porta do seu apartamento, algumas luzes não acenderam, deixando o corredor com uma leve penumbra. Marcelo viu um movimento estranho num dos cantos mais escuro, mas logo atribuiu a visão à sua embriaguez. Entrou em casa e foi direto para o quarto, arremessou o par de tênis para baixo da cama e deitou.
Jogado de bruços na cama, ainda com a roupa que saíra aquela noite, Marcelo roncava num sono profundo. A campainha tocou uma, duas, três, quatro vezes até que ele percebesse. O rapaz sentou na cama, esfregou os olhos e pensou que essas farras que ele tanto gostava, um dia acabariam com ele. Com a cabeça latejando de tanta dor caminhou até a cozinha quando ouviu a campainha tocar mais uma vez. “Não era um sonho”, disse ele. Mudou a rota para a porta da sala pensando em quem poderia ser àquela hora. Com certeza era um vizinho do prédio, uma vez que não houve toque no interfone. Lembrou-se de Karina, sua namorada e também vizinha, que morava um andar acima. Eles haviam brigado na noite anterior, poderia ser um pedido de reconciliação.
Faltavam alguns passos para chegar na porta quando a campainha tocou mais uma vez. Irritado, Marcelo grunhiu alguma coisa, apressou o passo, olhou pelo olho mágico. Não viu ninguém. O rapaz abriu a porta com cuidado, olhou para os dois lados do corredor colocando somente a cabeça para fora da porta e, mais uma vez, nada. Encostou a porta e antes de girar a chave para trancar a campainha tocou mais uma vez. O coração de Marcelo bateu forte, ele sabia que ninguém chegaria tão rápido. Tremendo ele olhou pelo olho mágico mais uma vez e viu uma silhueta. Um homem já segurava a maçaneta e a girava, enquanto do lado de dentro, Marcelo tentava sem sucesso impedir que a porta abrisse.
Marcelo foi empurrado junto com a porta e caiu no chão. O agressor, em pé na sua frente, segurava um cabo de vassoura quebrado. Ao tentar levantar-se, o rapaz assustado, ficou de costas para o estranho. Antes mesmo de dar o primeiro passo para fugir, Marcelo foi atingido na cabeça. A pancada abriu um pequeno corte, a dor irradiou por toda a coluna do rapaz que tropeçou e caiu novamente. De frente para o agressor, ainda no chão, ele protegeu o rosto de uma pancada com seu antebraço. Os golpes eram fortes. Marcelo ainda levou alguns chutes antes de conseguir correr em direção ao quarto. Ele fechou a porta, mas lembrou-se que não teria como trancar. As dores eram fortes e Marcelo gritou que chamaria a polícia. Não houve perseguição. O rapaz pegou o celular e se escondeu no closet. Ligou para a polícia dizendo que sua casa fora invadida. Tentou descrever o invasor, mas não conseguiu, disse também que estava ferido.
Ainda no closet, Marcelo ouve o interfone tocar. Com muito cuidado ele caminha até a sala, que estava intacta. A porta estava fechada. Ao atender o interfone, ouviu a voz do porteiro dizendo que a polícia estava lá. Marcelo disse que poderia subir e foi até a porta, olhou pelo olho mágico e viu somente um corredor vazio. Ele girou a maçaneta e a porta estava trancada. Confuso, ele destrancou, abriu e ficou aguardando o policial.
Dois policiais saem do elevador e caminham em sua direção, um deles olha para o lado e vê um balde com uma vassoura quebrada, mas não se importa. Marcelo os convida para entrar e conta toda a história. Um dos policiais examina o apartamento e não nota nada de estranho enquanto o outro, da maneira mais educada possível, orienta que Marcelo maneire na bebida. “Não há nada de errado e talvez tenha sido uma alucinação” disse o policial. Envergonhado, o rapaz leva os policiais até a porta e pede desculpas pelo incômodo. Um sinal de positivo foi a resposta de um dos policiais, que já caminhava para o elevador.
Marcelo passava a mão na cabeça e no braço, ambos sem ferimentos, enquanto caminhava para o quarto. Ele deitou na cama e ouviu a campainha tocar. Seu coração disparou novamente, mas dessa vez foi convicto até a porta acreditando ser a polícia ainda. Não era.
Karina estava parada em frente ao apartamento de Marcelo, que a observava pelo olho mágico. O rapaz abriu a porta ao notar que sua namorada chorava. A moça entrou e o abraçou, disse que tivera um sonho terrível. Ela contou que ouviu a campainha tocar e viu que era ele na porta. Ainda chorando, ela prosseguiu dizendo que ao abrir, ele a agrediu com um pedaço de madeira, batendo em sua cabeça. Completou dizendo que não entendia o porquê, mas ele continuava a bater enquanto ela se protegia com o braço. Marcelo abraçou sua namorada mais forte e, com muito carinho, colocou a cabeça da jovem em seu ombro. Ele viu que havia sangue ressecado nos cabelos dela. Ele ainda pode ver a marca roxa no braço de Karina. De maneira discreta, ele a afastou e segurou suas mãos. Olhando nos olhos da namorada, o rapaz disse que não passava de um sonho. Ela estava em estado de choque, ainda tremia e parecia bem desorientada. Marcelo mais uma vez confortou a garota com um abraço, fechou a porta e disse que tudo não passou de um pesadelo. Disse que ela poderia dormir na casa dele e a levou para o quarto.
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