“Spider-Man, Spider-Man,
Does whatever a spider can
Spins a web, any size,
Catches thieves just like flies
Look Out!
Here comes the Spider-Man”
Ao embalar sua tradicional vinheta com a famosa música-tema do Homem-Aranha, a Marvel prova (mais uma vez) que sabe exatamente o que seu fã deseja. E fica difícil não esboçar um sorriso ao ouvir os primeiros acordes da melodia, que embalou o primeiro desenho do Aranha em 1967. Em outras palavras, com menos de um minuto, o estúdio fez mais por seus fãs do que a Sony/Columbia em mais de 5 horas e meia (divididos entre dois “espetaculares” Homem-Aranha).
Mas a fórmula é fácil de identificar e executada com extremo cuidado: Inicie a projeção com inúmeras referências às produções anteriores; resgate um personagem que não aparecia há quase cinco anos (o Happy Hogan de Jon Favreau); adicione seu super-herói (ator) mais popular e invista (ou não erre) no tom característico do personagem que explorará a seguir. Pronto. A música-tema é só a cereja do bolo e conclui o processo de “captura” do fã. Detalhe: tudo isso com menos de 10 minutos de projeção.
Claro que isso seria um problema caso fosse planejado como uma espécie de disfarce desonesto para esconder ou amenizar um longa-metragem problemático, o que, felizmente, está longe de ser o caso de Homem-Aranha: De Volta ao Lar, novo filme/reboot de um dos mais celebrados super-heróis de todos os tempos.
Escrito por nada menos do que seis roteiristas (normalmente um problema), a produção deixa claro desde o início o tom que planeja adotar e tem a inteligência de confiar no conhecimento prévio do espectador para colocá-lo em prática, assumindo, por sua vez, que o espectador já está esperando um herói irreverente e juvenil (comentarei mais para frente) e, principalmente, que já sabe de cor e salteado a sua história de origem, o que nos poupa de ter que assistir, pela terceira vez, a morte do Tio Ben ou uma aranha geneticamente modificada dando super-poderes ao protagonista. Isso permite à produção investir muito mais tempo no desenvolvimento de seus personagens, o que só faz enriquecer a trama e nossa identificação com os mesmos.
Por falar nisso, Tom Holland (que despontou com o dramático O Impossível), exerce papel fundamental nesse sentido, pois consegue transmitir toda a inocência de Peter Parker e, sobretudo, toda a confusão que permeia o personagem, não nos deixando esquecer jamais que antes de ser um herói, Parker é, essencialmente, um adolescente. Adotando uma postura desajeitada e dizendo suas falas com rapidez, Holland não tem dificuldade em trazer humanidade ao papel e, de quebra, ainda se coloca facilmente como o mais expressivo entre todos os intérpretes do personagem (repare, por exemplo, no seu olhar enquanto observa Liz, ou em sua reação ao fazer uma descoberta importante no terceiro ato).
Liz, aliás, é mais um passo importante dado pela Disney/Marvel em aumentar a representatividade em suas produções, colocando uma atriz negra para interpretar o interesse amoroso do protagonista. E a jovem Laura Harrier o faz muito bem, justificando o fascínio de Parker. A representatividade também deve ser lembrada na escalação do ótimo Tony Revolori (O Grande Hotel Budapeste), de ascendência latina, como o bully Flash Thompson, maior rival de Peter e que, aqui, apresenta outras curiosas facetas.
E se Marisa Tomei, competente como sempre, aparece pouco, ao menos o “notável” rejuvenescimento de sua Tia May rende boas piadas sob a batuta de Tony Stark que, atuando como mentor do jovem herói, é encarnado com o carisma habitual de Robert Downey Jr., que ainda possui uma eficiente dinâmica com Tom Holland, sem ameaçar seu protagonismo.
Já Michael Keaton, encarnando mais um alter-ego de um personagem alado apenas três anos após Birdman, confunde “expressão” com “careta”, assimilando bem as compreensíveis motivações de seu vilão, mas soando artificial em alguns momentos, o que fica evidente quando o diretor Jon Watts (A Viatura) resolve fazer um close-up.
Watts, por sinal, faz um belo trabalho ao conduzir as sequências que se passam na escola, lembrando propositalmente os filmes adolescentes da década de 80 (e a clara referência a Curtindo a Vida Adoidado não acontece por acaso. Em contrapartida, o cineasta tem relativa dificuldade em elaborar as sequências de ação (que eram o forte da primeira trilogia Homem-Aranha), convertendo os confrontos de seu herói a uma mistura de acrobacias, sopapos e teias. E se a produção conseguiu corrigir a natureza artificial do uniforme do Aranha, o mesmo não pode ser dito de seus movimentos, que em alguns momentos evidenciam seu caráter digital.
Beneficiando-se de efeitos visuais que, embora não cheguem perto da qualidade apresentada por Homem-Aranha 2, pelo menos não embaraçam a produção, que ainda conta com mais uma ótima trilha sonora composta pelo excelente Michael Giacchino (que também brilhou com Doutor Estranho), que em nenhum momento adota a grandiloquência tão comum em filmes do gênero, pelo contrário, aproveita até mesmo o clássico tema cujos primeiros versos abriram este texto.
Brincando com praticamente tudo à sua volta, Homem-Aranha: De Volta ao Lar reflete com perfeição a personalidade de seu(s) protagonista(s), sabendo utilizar o humor com inteligência, sem apresentar os excessos que tanto costumam atrapalhar algumas produções Marvel, e essa sua irreverência permite, até mesmo, um sutil comentário político (“protestar é patriótico”), demonstrando que o filme não ignora a época que retrata.
Divertido, ágil, e com uma vigor juvenil de fazer inveja, o mais novo Homem-Aranha é a certeza de que sua introdução no Universo Marvel lhe foi muito benéfico, mostrando que o personagem ainda tem fôlego para muitas aventuras. E não ouse perder as cenas adicionais após os créditos!
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