A expectativa de muita gente estava alta com o segundo longa dos Vingadores. E Joss Whedon não decepcionou. Dirigiu e roteirizou Vingadores: Era de Ultron com muitos acertos, especialmente quando explora a humanidade em uma trama fantástica que reúne diversos heróis concebidos no universo deStan Lee.
Mergulhando o espectador em um plano sequência de tirar o fôlego para reapresentar todos os heróis principais (e de quebra mostrar o amadurecimento da equipe que utiliza os poderes em conjunto), Whedon conta como as consequências das ações de Tony Stark (Downey Jr.) trarão ao mundo perigos cada vez mais destrutivos. Esse é o primeiro acerto de Whedon: os Vingadores são a causa dos perigos que devem enfrentar.
A partir de experimentos de Stark e Banner (Ruffalo), uma inteligência artificial do programa Ultron (Spader) toma forma física e ameça a humanidade de extinção como único meio de garantir a paz na Terra. Liderados por Capitão América (Evans), os Vingadores Homem de Ferro, Thor (Hemsworth), Viúva Negra (Johansson), Hulk e Gavião Arqueiro (Renner) encontram nesse episódio um desafio que, mesmo juntos, são incapazes de enfrentar e dependerão de todas as forças de aliados antigos e novos para salvar o mundo.
Com atores competentes e já absolutamente seguros de como interpretar seus personagens, Whedon volta seu olhar para uma inédita construção de cada um dos Vingadores, o que culmina em um belo estudo das vulnerabilidades dos heróis. Cada conflito interno trata de humanizar os heróis, que agora percebem como são acima de tudo um perigo para outras pessoas. Utilizando uma espécie de flashbacks que funcionam como verdadeiros tormentos nos personagens, Whedon traz os poderes de Feiticeira Escarlate (Olsen) para aprofundar esse estudo.
Bruce Banner encara a solidão de um sujeito que não pode ser exposto a nada que o transforme em um monstro destrutivo que “evita lutar, pois sabe que vai vencer”. Natasha Romanoff (que ganha uma importante e linda função no grupo) vê em sua história a criação de uma assassina fria que jamais poderá desfrutar de uma família como a de Clint Barton, que, em uma sacada extraordinária do diretor, é o único dos Vingadores a ter algo realmente precioso a perder cada vez que parte em uma missão.
Nesse momento da história, note como o design de produção se preocupa em criar um passado de Barton com elementos que remetem diretamente às suas habilidades, como um jogo de dardos na cozinha e um alvo abandonado no celeiro. Steve Rogers sente o distanciamento de uma sociedade à qual jamais poderá pertencer. Thor reconhece a necessidade de buscar ajuda na humanidade (há uma breve cena em que ele força um disfarce ciente do perigo que representa naquele momento) depois de perceber estar muito mais a vontade na Terra do que em Asgard. Mas é Tony Stark que tem o conflito desenvolvido com mais detalhes, afinal, Ultron nada mais é do que seu duplo, uma exposição do seu lado sombrio que cresce exponencialmente no sentido oposto do seu desejo egocêntrico de salvar a humanidade através de suas criações.
Com as ideias distorcidas, Ultron é uma das melhores construções de vilão das adaptações cinematográficas do universo Marvel, perdendo somente para a construção de Magneto. O diretor constrói o vilão a partir da inteligência artificial imaginada por Stark que funciona como um reflexo da natureza destrutiva da consciência coletiva da nossa humanidade nos dias de hoje, que abriria mão do debate para eliminar definitivamente qualquer vestígio dos opositores e suas ideias. Se em X-Men temos o debate contra homofobia, aqui temos Ultron com o objetivo de exterminar a humanidade por causa da culpa que atribui a apenas alguns, o que imediatamente remete a conhecidos extremistas políticos e religiosos.
Conflitos pessoais à parte, os três principais Vingadores têm, agora, uma dinâmica mais interessante do que a vista no filme anterior, algo bem parecido do que vemos entre Kirk, Spock e McCoy em Star Trek. Rogers, Stark e Thor percebem a necessidade de trabalhar em grupo e o peso de decidir as coisas em conjunto. Muito além de se limitarem a comemorar as vitórias, os heróis encontram maturidade para assumir os erros dos outros para não comprometer os demais membros do grupo.
Era de Ultron ainda traz de volta velhos conhecidos em outros filmes e apresenta novos e interessantes personagens. Havia a expectativa com os gêmeos Maximoff, especialmente com Pietro, já visto em uma antológica cena em X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido. O Mercúrio deste filme não fica atrás. Suas aparições são excelentes. Ainda que não sejam tão divertidas quanto as de Evan Peters, Aaron Taylor-Johnson entrega um personagem dramaticamente interessante e capaz de se redimir de forma tocante. Além disso, uma excelente sequência envolvendo um trem vem pra fazer frente à sequência de X-Men. Sua irmã Wanda é a Feiticeira Escarlate, indispensável na trama central. Outro personagem genial é Visão, vivido pelo sempre competente Paul Bettany, responsável também pela voz de Jarvis em todos os filmes (e isso é essencial na construção do personagem).
Os efeitos visuais e especiais estão incríveis, o que já é de se esperar. Hulk esmagando cidades, Thor e Capitão América unindo forças em ataques especiais, lutas coreografadas da Viúva Negra e Gavião Arqueiro além de maravilhosas sequências aéreas contra os robôs de Ultron garantem um filme tão empolgante quanto divertido -graças às inúmeras piadas contidas no roteiro de Whedon. Ciente de que as cenas de ação tomarão conta da história, o diretor tem a elegância de incluir vários planos longos para equilibrar a narrativa e deixar o filme fluído, aproveitando por completo a fotografia sóbria de Ben Davis.
O cinematógrafo consegue reunir os personagens de diversas histórias anteriores com fotografias diferentes sem que isso soe artificial em qualquer momento. Talvez por essa razão que a sequência inicial seja ambientada na neve, o que facilita equilibrar essa nova paleta. Note como ele usa a tonalidade das cores pra trazer personagens como Hulk, Thor e Visão (Bettany) ao mesmo ambiente do Homem de Ferro e Capitão América de uma forma mais eficiente que o primeiro filme dos Vingadores. A presença de Davis nessa sequência dá sinais de que será também o cinematógrafo do terceiro Vingadores, afinal, há a expectativa de unir esse universo ao Guardiões da Galáxia. Bom sinal. Davis, habituado aos dois universos, será o responsável por uni-los.
A diversão é garantida. Mas não vá ver o filme só por isso. Vingadores: Era de Ultron é sobretudo um filme tocante, bonito e humanizado. Não é um filme de heróis salvando o mundo, mas um filme de heróis salvando o mundo começando por salvar pessoas. E estamos apenas na metade do caminho de tudo o que prometeu a Marvel.
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