Filmes que retratam a evolução de uma doença são, por natureza, presos a um arco dramático que tende a levar o espectador às lágrimas em vários momentos, já que inevitavelmente levará seu protagonista a um desfecho esperado (de acordo com cada doença) e durante toda a narrativa seremos apresentados a ações colocadas ali para aumentar ainda mais o impacto emocional da perda.
Logo, torcemos por uma cura, mesmo sabendo que ela não virá e lamentamos mais e mais a cada cena que nos mostra os projetos que serão interrompidos, as reações das pessoas diante da morte de um ente querido e por aí vai. E isso acontece porque sabemos que estamos sujeitos às situações apresentadas em dramas desse tipo e é acabamos refletindo as ações do filme na nossa própria vida.
Não é diferente em Para Sempre Alice. Adaptado e co-dirigido por Richard Glatzer e Wash Westmoreland a partir do livro homônimo de Lisa Genova, o filme conta a história de uma neuro-linguista a partir do momento em que os primeiros sintomas de Mal de Alzheimer começam a surgir e causar pequenos conflitos em sua vida. Alice Howland (Julianne Moore), consciente do que pode estar prestes a enfrentar, busca as respostas definitivas do diagnóstico e então começa a rotina de tratamentos para retardar o avanço da doença enquanto adapta sua vida e de todos que estão próximos.
Por um lado, Para Sempre Alice é bastante competente ao evoluir a doença neuro-degenerativa da protagonista utilizando elementos de cena. Note como o hábito de jogar palavras-cruzadas em aplicativos online com a filha auxilia a mostrar o quadro de Alice. Assim como o uso de outros dispositivos eletrônicos como sem fossem uma memória extra, o que flerta com as inúmeras possibilidades da tecnologia já à disposição de todos pode oferecer. Mais do que isso, um vídeo gravado no computador garante a cena mais tensa do filme e ainda oferece a oportunidade de mostrar a protagonista em dois momentos lado a lado: no começo da doença quando grava uma mensagem para si mesma e depois já em um estágio avançado, quando sequer se lembra de coisas que ouviu segundos antes.
A cinematografia de Denis Lenoir é ajuda a retratar os momentos em que Alice enfrenta a doença em cenários pálidos e com cores frias dessaturadas que contrastam com os momentos em família, onde a composição de cores acentua o aconchego de estar entre pessoas que ama. Além disso, os movimentos de câmera dos diretores são bem interessantes, como o giro de 360° em torno de Alice somado a uma gradativa perda de foco quando ela se sente perdida pela primeira vez, bem como a maneira que decidem posicionar a câmera durante as consultas, dando ao expectador a chance de avaliá-la, o que é uma decisão bastante acertada dado o que está por acontecer.
Por outro lado, o roteiro é extremamente exagerado ao contextualizar a personagem em jantares e almoços de família, perdida durante uma atividade física, sem mencionar a obviedade dos demais personagens: o marido (Alec Baldwin) em bom momento profissional que fica entre viajar a trabalho e passar com a esposa o que talvez seja o último ano de lucidez dela, o filho médico (Hunter Parrish) que naturalmente sabe a gravidade do problema, a filha grávida (Kate Bosworth) que intensifica a necessidade de atrasar o avanço da doença para que Alice veja o neto e, por fim, a filha rebelde (Kristen Stewart, cada vez melhor) que, artista, afasta-se da família para perseguir planos diferentes daqueles que os pais tinham pensado pra ela. Fique tranquilo, nada do que acabo de revelar é spoiler, afinal, como disse, o melhor do filme está em como a protagonista lida com cada personagem clichê que Genova construiu para sua história. Outro ponto fraco é a trilha sonora de Ilan Eshkeri que não se acanha em tocar violinos quando quer forçar o choro no espectador.
Mas tudo isso funciona graças a uma personagem forte, determinada e, principalmente, segura de como vai enfrentar a doença graças a sua formação pessoal e profissional. Alice faz com que todos os clichês colocados na história funcionem como aqueles momentos irônicos da vida. Moore carrega um piano nas costas. Sua atuação (que lhe garantiu o Oscar) não tem altos e baixos. É uma crescente só. Moore mostra todo o seu talento e toda a sua maturidade artística em seu rosto envelhecido e seu olhar vazio contrapostos à mãe, professora, intelectual e mulher espetacular que luta para não perder o que há de mais valioso deixado pelo caráter efêmero da vida: as memórias do que construímos durante nosso passado.
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