Uma dúvida acompanhava a expectativa do terceiro longa da franquia Mercenários: como o roteiro seria capaz de desenvolver tantos personagens importantes dos filmes anteriores além de apresentar novos membros ao time de Barney (Stallone) sem perder o ritmo de ação que, como sabemos, baseia-se no legado que o elenco já deixou no gênero.
O resultado é positivo. Muito positivo. Mercenários 3 cumpre com todas as propostas, faz rir, empolga e ainda deixa a porta aberta para mais sequências com mais atores no elenco – e nunca imaginei que diria isso sobre uma franquia desse tipo.
Sylvester Stallone assina o roteiro em parceria com Creighton Rothenberger e Katrin Benedikt (roteiristas do recente Invasão à Casa Branca). É de forma orgânica, coesa e precisa que os roteiristas resolvem o problema apresentado acima e assim somos apresentados (ou reapresentados) aos personagens que entram na história como passageiros de várias estações em um mesmo trem. Não são poucos: Barney (Stallone), Christmas (Stathan), Trench (Schwazernegger), Caesar (Crews), Gunner (Lundgren), Road (Couture) e Yang (Li) estão de volta e ganham o reforço dos veteranos Doc (Snipes), Galgo (Banderas) e Drummer (Ford) além dos novatos Smilee (Lutz), Luna (Rousey), Thorn (Powell) e Mars (Ortiz). Completam o elenco Mel Gibson como o interessante vilão Stonebanks (em um filme cheio de referências, Longshanks era o nome do vilão em Coração Valente) e Kelsey Grammer, Bonaparte, que cumpre o importante papel de reunir o novo grupo.
É um bom roteiro, mas sim, já sabemos o que vamos ver no filme e já sabemos onde fica a estação final onde todos devem descer. E mesmo assim, cada ato do filme é eficiente a começar pelo ótimo prólogo que… opss… é um resgate em um trem em movimento quando parte do elenco começa a reunir o grupo.
O primeiro é o personagem de Wesley Snipes, que é uma das grandes atrações do filme, especialmente quando o personagem solta uma piada que remete diretamente ao maior escândalo da vida do ator. A partir daí, a história narra como os Mercenários veteranos liderados por Barney precisam ser substituídos por jovens em uma missão de risco para capturar vivo um traficante de armas com um enorme exército sob seu controle. Coisa fácil que fica difícil por causa do choque de gerações que é tratado com habilidade pelo diretor.
Patrick Hughes dirige o filme muito bem, com boas sequências de ação e com uma boa medida daquelas cenas impossíveis que a franquia promete sem que isso afunde a história como já vimos em outros exemplares do gênero. Não há como negar que as referências a filmes anteriores desses atores veteranos funcionam como elemento narrativo de qualquer filme dos Mercenários. O espectador espera ver pistas que remetam às produções da década de oitenta e noventa. O mérito de Stallone não é só incluir essas referências (algumas até sutis, como o uso do termo “blade” em um diálogo de Snipes – que se perderá na dublagem), mas também usá-las para mover a narrativa adiante, como na motivação de Barney quando decide encarar uma guerra sozinho, o modo que Stonebanks decide usar para o confronto final ou mesmo uma pilotagem de helicóptero com manobras evasivas que nos levam a outro clássico da ficção científica.
E com isso chego ao único problema que me incomodou no filme. Sabendo que essas referências a outros sucessos são elementos importantes nesse universo, fica faltando algo nos quatro novatos que, quando chegam ao grande momento do arco de cada um, ficam sem a mesma identificação do público, já que são interpretados por atores sem o mesmo legado dos veteranos. Vale dizer que todos estão bem no filme, não comprometem e não são intimidados na presença dos outros. Tampouco o filme é pior por conta dessa escalação, apenas imagino como seria muito interessante ver Chris Pine no papel de Smilee ou Michelle Rodriguez no papel de Luna, atores cujo legado permitiria piadas que remeteriam a Kirk de Star Trek, uma vez que Smille tem sérios problemas com hierarquia, ou a qualquer durona que Rodriguez já tivesse interpretado. Claro, preciosismo meu já que sinto essas referências como parte do universo concebido para essa franquia.
Isso é tão verdade que a direção de arte procura resolver e resolve de forma óbvia, mas digna de méritos. Se os atores não levam um legado para o filme, isso é compensado com cenários e objetos de cena para criar uma identificação visual com o curto passado deles ao clímax no terceiro ato. Ou seja, se um deles é apresentado em uma moto, ele usará a moto no terceiro ato; se outro é apresentado em uma boate, terá “seu momento” em um casino destruído enquanto outro, apresentado em uma escalada, precisará subir um fosso de elevador apenas usando braços e pernas.
As locações e a fotografia também contribuem para construir o perigo e a tensão onde os personagens serão inseridos, seja um trilho e um trem em alta velocidade onde conquistarão rapidamente o objetivo, seja um caminho sinuoso de pedras que devem cruzar lentamente a pé até chegarem a um lugar já destruído por uma força militar supostamente superior à deles.
Mesmo entre tantas explosões, Stallone encontra espaço para incluir um bom diálogo numa cena de bar onde parece discutir a própria relação dos atores com o gênero de ação que os levou ao estrelato – ideia também presente na cena em que um ator meio sumido de grandes filmes do gênero agradece Barney pelo emprego e em outra que reúne os quatro novos em um momento de descontração.
É uma diversão garantida. Claro que os amantes de ação são o público alvo de Mercenários 3, mas a produção está longe de ser um pastelão cheio de explosões e testosterona. O filme é capaz de rir dos atores, dos personagens e da própria estrutura, como fica claro no momento que Mel Gibson diz algo como “Não conseguem matar dez caras? Conseguem ao menos feri-los?”. É claro que não. E nem deveriam!
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