A Morte de Stalin é um ataque explícito aos poderosos. Se prepare para um filme cômico, mas com imagens grandiosas e dolorosas que percebemos em meio às risadas sutis.
Desconhecia o trabalho do diretor Armando Iannis, conhecido pela direção das séries “Veep” e “The Thick of it”, mas que é conhecido por seus trabalhos terem um forte critica às estruturas de poder, tanto antigas como atuais (o que nos faz repensar se mudaram realmente com o tempo ou se, apenas, as atrocidades deram uma leve moderada).
A Morte de Stalin é uma tragicomédia, trazendo o uso da linguagem da HQ francesa para um tema tão delicado de ser debatido e com um humor apurado, que provocará risadas sutis e possivelmente incomodará alguns espectadores.
O filme já provocou polêmica na Rússia (país que obviamente seria o mais afetado, por falar do seu ditador – abismante ser idolatrado por parte dos russos). O filme incomodou tanto o ego de alguns, que foi alvo de censura na Rússia pelo governo.
A obra de Iannucci é vista como abominável, desrespeitosa e os entusiastas de Stálin o veem como um ataque do diretor e uma campanha ideológica contra a Rússia.
Seria uma zombaria de Iannucci ou uma forma de chacoalhar os espectadores para o tamanho absurdo que um ditador e seus poderes causaram?
Em entrevista, o diretor alega que foi necessário fazer este filme de forma engraçada para que, em pleno riso, percebamos que tudo aconteceu de verdade. Sim, é um filme que ri do Stalinismo e o provoca.
A Rússia tinha um ditador mimado e caso alguém não andasse na linha, era preso ou morto.
Será que os eventos mudaram ou só estão menos sangrentos? Stálin em seu período de poder matou mais de 50 milhões de pessoas.
No filme, ele é retratado como um homem frio e totalmente sem sentimentos e as escolhas de suas mortes é como se fosse uma brincadeira para relaxar. Cada dia uma lista, que não poupa nem os amigos. Falando em amigos, o ditador era rodeado de interesseiros que são retratados magnificamente pelo elenco como homens inseguros, atrapalhados e hipócritas.
Ianucci escalou um elenco maravilhoso de atores britânicos, americanos que falam inglês no filme e não russo. São caricaturas e o diretor consegue pincelar em cada figura histórica o pior e mais ridículo do que um ser humano pode chegar.
O filme não é realista e permite, o elenco, levar seus personagens ao extremo. Na ficha técnica temos Jeffrey Tambor, Steve Buscemi, Simon Russell Beale, Michael Palin, Jason Isaacs, Andrea Riseborough (uma das poucas aparições de mulheres num filme extremamente machista e de homens, mas que apresenta uma construção interessante como a filha de Stálin) e Padaly Considine. É invejável a química e sintonia dos atores e como formam um excelente conjunto. Mesmo o filme não sendo marcante ou tendo uma excelência, ele não peca pela ótima direção e a escalação do elenco.
Em 1953, Stálin (interpretado por 15 min. por Adrian Mcloughlin) sofre um derrame em seu quarto e agoniza ironicamente numa poça de urina. Cincos dias após o incidente, ele falece de uma hemorragia cerebral. O fato interessante e que, ao ser encontrado no quarto, nenhuma autoridade chama um médico, pois a maioria foram mortos ou presos pelo ditador e a desconfiança dos seus assessores, que alegavam que os médicos planejavam, há anos, a morte do seu chefe. Irônico, não?
Poderia citar todos os “grandes amigos de confiança “do ditador, mas o interessante é você conhecê-los diante da tela ou ter a vontade de pesquisar sobre estes. Mas destaco Nikita Kruchov e Lavrenti Beria interpretados brilhantemente por Steve Buscemi e Simon Russell Beale. Todas as autoridades se apunhalam pelas costas e suas decisões equivocadas ecoam no povo.
Após seu acidente e até sua morte a decisão esta nas mãos atrapalhadas do alto escalão do comitê do Partido Comunista. Veremos uma verdadeira encenação de como os “poderosos”, sedentos para ascender em seus cargos, se tornarão diretores de um funeral e como constroem uma imagem de dor e compadecimento pela morte de seu governante.
Todos têm uma imagem a zelar diante da União Soviética e perante uns aos outros. Este é o momento crucial para se criar aliados e mexer no que Stálin deixou arrumado como queria.
As interpretações e situações que o diretor coloca sobre a tela do cinema deve ter incomodado os russos em suas cadeiras, pois vemos um show de situações estúpidas que um ser humano pode chegar. Tudo isso levado num ritmo louco, usando a HQ como apresentação dos personagens (baseado na graphic novel de Fabien Nuny e Thierry Robin) e com um humor sofisticado (que talvez afaste o público geral da obra).
Não tenho como omitir que você deve pelo menos saber um pouco sobre a União Soviética e conhecer o mínimo sobre a trajetória horrenda do ditador, mas caso não tenha conhecimento, o importante é saber o quanto de atrocidades e ridículo um homem pode chegar para estar no topo.
No filme, vemos uma briga corrosiva entre figuras históricas pela sucessão do poder (vice de Stálin, chefe do governo secreto, diretor das forças armadas e ministros). Quem será o sucessor do líder soviético?
Confesso que o filme tem momentos ótimos, mas cansa.
Você acha graça da narrativa, mas se incomoda com o real. Não é um filme marcante, mas é um filme diferente sobre política. E o mais interessante é saber que o diretor tentou ser o mais fiel ao que aconteceu de fato e como os acontecimentos reais causam repulsa. Repulsa maior é saber que atualmente os russos veem Stálin como uma figura importante tal qual seu atual presidente Vladmir Putin. Até por que vamos esquecer que Stálin matou inúmeras pessoas e até de fome, pois teve o grande trunfo de modernizar a Rússia e repelir e vencer os alemães. Como não amá-lo?
O filme é um desrespeito à legislação e uma afronta ao aniversário da vitória da Batalha de Stalingrado, mas quem sou eu para julgar o patriotismo dos russos.
Veja este filme que terá sua estreia dia 7 de junho nos cinemas e chegue as suas próprias conclusões.
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